Thursday, March 30, 2006

Diário

Acordei assustado. Desde de que me mudara para o Rio há alguns meses atrás, acordar com um imenso vazio dentro de mim, era uma rotina. E isso me assustava. Tanto que já andava meio descreste. Estava perdido nas minhas convicções. Não sabia se era pelo stress do emprego, se era pelo salário injusto, se era pela falta de amor, ou se era pela enorme distância que me separava do meus sonhos. Mas não era tão óbvio. Eu que fora sempre um exemplo de determinação, agora não acreditava mais. Mal sabia que estava perto demais para poder entender o tamanho do vazio que sentia. E nem imaginava que horas depois, aquele dia de domingo mudaria minha vida para sempre.

Resolvi caminhar para aliviar a tensão dos meus pensamentos. O dia estava lindo, mas não pensava em ir praia. Havia algo errado no reino dos céus. Dezoito anos, empregado, bem casado, um filho lindo, e ainda sim infeliz. Ainda sim com um enorme vazio que me sufocava como uma droga que lhe mata lentamente. Nunca fui religioso, mas rezei. Está certo, mentia que ia à missa para poder jogar bola, mas sempre acreditei que Deus está em todo lugar, que Cristo poder ser aquele mendigo da esquina, se existe uma Pedra, Ele está lá. Por isso rezei. Gostaria de entender os sinais. Pedia impetuosamente uma dádiva. Vagava, perdido em minha fé, quando percebi que aquilo que tanto me marcara na infância, estava agora como um brinquedo velho que achara repentinamente jogado no porão. Vi de longe uma luz que, por poucos segundos, me cegou. Repentinamente ela me encontrou. Sem querer, meio que guiado por forças ocultas, meio sem entender nada, como se tivesse acabado de recuperar a consciência, me encontrava diante da visão mais iluminada da mina vida. Era o sinal.

Sentando num templo suntuoso, onde até o maior dos ateus acreditaria nessa força superior, eu simplesmente não acreditava no que meus olhos viam.
Ao meu lado fiéis fervorosos ajoelhados às lágrimas, agradecendo aos deuses, quase que numa crise de euforia coletiva. No centro, descobri que alguns anjos não têm asas, e num balé exuberante, voam perante nossos olhos. Mais na extremidade do enorme templo, percebi que certos santos ainda vivem, e operam milagres, com a mesma facilidade que Jesus multiplicou os pães. Entendi que a fé desperta cânticos dignos de uma ópera de Vivaldi. Os Bispos, caprichosamente vestidos de negro, que ministram esta sinfonia, são idolatrados e odiados num esplendoroso e simples segundo.
Era uma tarde quente, um domingo como mais um domingo, Lagoa, Cristo, Humaitá, Coqueirão. Era. Mas não foi. Depois desse dia 19 de março, entendi a magia que fez e faz tantos Zicos, tantos Bebetos, tantos Nunes, tantos Romários. São eles que nos dão visões divinas, mas mesmo assim não são eles quem criam os milagres. È esse algo mais que não conseguimos explicar, e mesmo assim aumentam a cada dia a nossa fé. É algo mais que faz nos rir e chorar. É algo que não existe nada que seja mais. É algo que se chama fazer meu primeiro gol, no Imaculado e eterno Maracanã.